Os trabalhadores estão perdendo no Tribunal Superior do Trabalho (TST) a discussão sobre um dos pontos mais polêmicos da reforma trabalhista: o que estabeleceu o pagamento de honorários em caso de derrota (sucumbência), mesmo por beneficiário da justiça gratuita. Duas das oito turmas da Corte já analisaram o tema e, em decisões unânimes, mantiveram a obrigação.
Antes da reforma, o trabalhador não pagava honorários de sucumbência ao advogado da empresa. Agora, está sujeito a ter que desembolsar de 5% a 15% sobre as verbas não concedidas pela Justiça. Os percentuais estão previstos no artigo 791-A da lei da reforma (nº 13.467, de 2017).
Os defensores da medida entendem que é essencial para evitar o que chamam de “processos aventureiros”. Até então, os trabalhadores entravam com vários pedidos por não terem nada a perder. Para os representantes de trabalhadores, porém, a cobrança inibe o acesso à Justiça, principalmente dos mais pobres.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já começaram a analisar a questão, por meio de ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5766) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Por enquanto, foram proferidos apenas dois votos, em sentidos diferentes, pelos ministros Luís Roberto Barroso, relator do caso, e Edson Fachin.
No TST, o placar é desfavorável aos trabalhadores. Em decisão proferida em maio, a 3ª Turma, com base no voto do relator, ministro Alberto Bresciani, afirma que, no âmbito do processo do trabalho, a imposição pelo legislador de honorários sucumbenciais ao reclamante reflete a intenção de desestimular lides temerárias (AIRR nº 2054-06.2017. 5.11.0003). “É uma opção política”, diz em seu voto o relator.
Para os julgadores da 3ª Turma, a reforma demonstra preocupação com eventual supressão do direito fundamental de acesso à Justiça. A norma, acrescentam na decisão, prevê que só será exigido do beneficiário da justiça gratuita o pagamento de honorários se ele tiver créditos suficientes, neste ou em outro processo. A cobrança só poderá ser feita nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão.
“Os condicionamentos impostos restauram a situação de isonomia do atual beneficiário da justiça gratuita e demais postulantes”, afirma o relator em seu voto. Para ele, o acesso ao Judiciário é amplo, mas não incondicionado. A decisão foi unânime e transitou em julgado (não cabe mais recurso).
A outra decisão contrária ao trabalhador é da 8ª Turma. Foi proferida em março, de forma unânime (AIRR 10184-51.2018.5.03.0074). A relatora, ministra Dora Maria da Costa, cita em seu voto a Instrução Normativa nº 41, de 2018. Nela, o TST firmou a aplicação dos honorários sucumbenciais às ações propostas a partir de novembro de 2017.
A instrução normativa indica que o TST considera o dispositivo válido, mas se alguma turma discordar, pode questionar a sua constitucionalidade, segundo o advogado Luciano Andrade Pinheiro, do escritório Corrêa da Veiga Advogados.
Para o advogado Ronaldo Tolentino, do Ferraz dos Passos Advocacia e Consultoria, que atua na representação de trabalhadores, a decisão em duas turmas não significa que o assunto está pacificado no TST. Nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs), acrescenta, ainda há divergência sobre o assunto. “Essa norma veio para aterrorizar o trabalhador”, diz.
Ricardo Calcini, professor de direito do trabalho, entende, porém, que as decisões mostram uma tendência do TST de não considerar inconstitucional esse ponto da reforma trabalhista. “O tema é um dos mais relevantes. Para declarar inconstitucional, as turmas devem encaminhar o assunto ao Pleno”, afirma o advogado.
O TST já elaborou uma lista com 20 súmulas e orientações que estão em desacordo com a Lei nº 13.467, de 2017. Mas ainda não pode alterar os trechos. Isso porque a análise está atrelada a um outro julgamento, em que o Pleno do TST se posicionará sobre o artigo 702, incluído pela reforma na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e que estabeleceu um rito próprio para a edição e alteração de súmulas e enunciados.
A constitucionalidade do artigo seria analisada em março e, em seguida, os ministros fariam o exame das súmulas. Às vésperas do julgamento, porém, entidades empresariais ingressaram com uma ação direta de constitucionalidade (ADC) no Supremo Tribunal Federal para que o 702 fosse declarado válido. Como havia pedido do relator, Ricardo Lewandowski, para que o TST se manifestasse, os ministros decidiram adiar a discussão.
Por Beatriz Olivon | De Brasília
Fonte: Valor Econômico